23/02/2010

PARA SEMPRE: Eça de Queiroz

"E pensarmos nós, caro Chagas, que enquanto você está aí ocupado a compor no "Atlântico" uma formidável equação algébrica, para provar (Deus me perdoe!) não sei que coisas sinistras sobre as Molucas; enquanto eu estou aqui abandonado a este palrar indiscreto - o grande Darwin publica o seu livro do "Movimento das Plantas", o professor Huxley lança o seu grande manifesto da "Educação Científica contra a Educação Clássica", Zola dá-nos o seu prodigioso trabalho sobre "Gustavo Flaubert", tantos outros trabalham e criam, e o Génio do século forja, com um ruído sublime, na sua bigorna de bronze e ouro, as ideias e as palavras que ficam. E nós aqui a escrevinharmos não sei que coisinhas minúsculas, que, apenas rabeiam um momento sobre o papel, são logo pó imperceptível!..." [a propósito de um artigo de Eça de Queiroz sobre Portugal, que Pinheiro Chagas disse ter insultado o País]
Eça de Queiroz, Notas Contemporâneas, Lisboa, Livros do Brasil, 2000, pp.60-61 [primeira edição em 1909, póstuma].

A VER: O Botânico da primeira metade do século XIX



Fonte: Marcia Willis, Jungle, Rivers and Mountain Peaks, London, Aldus Books Limited, 1973, p.110.

AGENDA: Identificação de Aves

A Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), está a organizar um Curso de Identificação de Aves Marinhas, a realizar-se em Peniche e Cabo Carvoeiro, nos dia 2, 3 e 4 de Abril.

Mais informações sobre esta iniciativa e a Associação em: http://www.spea.pt/

AGENDA: Cursos LPN

A Liga para a Protecção da Natureza (LPN) no próximo mês de Março três cursos de formação ambiental.

1-Protecção de solos (em colaboração com a Sociedade Portuguesa da Ciência do Solo), terá lugar em Lisboa, de 1 a 6 de Março. 2ª a 6ª feira das 18h-21h e Sábado, das 9h às 16h30.

2- Educação Ambiental II: Sustentabilidade nas cidades, no consumo e nos resíduos. Terá lugar em Lisboa, de 12 a 14 de Março. 6ª feira, das 18h-21h; Sábado, das 9h às 18h30; Domingo, das 9h às 13h.

3- Avaliação de Impacte Ambiental. Lisboa, de 15 a 19 de Março. 2ª a 6ª feira, das 18h às 22h.

Mais informações no site da LPN - Formação:
www.projectos.lpn.pt/formacao

02/02/2010

BIOGRAFIA: Rómulo de Carvalho - Vida e Obra III

Com este breve esboço biográfico, tentei dar a conhecer Rómulo de Carvalho como pessoa e como divulgador de ciência. Termino esta viagem, com Rómulo de Carvalho enquanto poeta. Lembro que a sua poesia era assinada sob o pseudónimo de António Gedeão, sendo da sua autoria, poemas de sempre como "A Pedra Filosofal" ou "Lágrima de Preta". Este último poema transcrevo-o em baixo. Note-se
o talento de Rómulo, que até conseguiu que as suas duas amantes vivessem juntas - refiro-me, claro, à ciência e à poesia. Não esquecer que o dia 24 de Novembro, dia do seu nascimento, é celebrado desde 1997, como o Dia Nacional da Cultura Científica. Sem mais delongas, segue o poema.

“Lágrima de Preta” – António Gedeão in Máquina de Fogo

Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

Nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
e cloreto de sódio."

BIOGRAFIA: Rómulo de Carvalho - Vida e Obra II

A História Natural em Portugal no Século XVIII

Da vasta obra publicada pelo cientista Rómulo de Carvalho, saliento, neste texto, A História Natural em Portugal no Século XVIII (1987). Abordarei, brevemente, alguns dos capítulos, deixando o mote para a leitura integral deste livro, pequeno em tamanho, mas grande em interesse. São cerca de 100 páginas, divididas por seis capítulos, que se lêem de uma assentada.

A História Natural

Assim, o livro principia com o capítulo dedicado ao interesse pela História Natural no nosso país, no século em estudo. Este interesse terá tido origem em dois factores, a saber: o facto de os portugueses estarem espalhados pelo mundo, em vários continentes, com acesso a plantas, animais e minerais, muitos deles nunca antes revelados; e pelo contacto com a euforia com que os cientistas estrangeiros se dedicavam à recolha, observação, catalogação de tudo o que encontravam. Para além do mero interesse e curiosidade pelo que é estranho e novo, havia também uma preocupação económica e científica – notar que ciência e economia caminham sempre juntas, uma vez que investindo na primeira, melhora-se a segunda. A fauna observada permitiu uma variedade de tratados zoológicos, aclamados a nível académico e, simultaneamente, causando espanto junto da sociedade; a nível geológico e mineralógico ansiava-se perante a possibilidade da descoberta de metais e pedras preciosas; e, atendendo à flora, esperava-se encontrar plantas com valor comercial, como a canela e a pimenta, assim como com valor medicinal, e de onde surgiram publicações de enorme impacto científico, recordadas ainda hoje, como Colóquios dos Simples e Drogas da Índia de Garcia de Orta.

É a flora do nosso país que parece cativar mais interessados, não só portugueses, como também inúmeros estrangeiros. Reinava D. João IV, quando chegou a Portugal o médico alemão Gabriel Grisley, cujo interesse pela nossa flora originou a publicação de Viridarium Lusitanicum (1661), ou seja, O Jardim da Lusitânia [1]. Pela mesma razão, vieram também a Portugal, anos mais tarde, os botânicos franceses Joseph Pitton de Tournefort (1656-1708) e Antoine de Jussieu (1686-1758).

Outro naturalista que visitou Portugal foi Merveilleux [2], e que, a pedido do monarca D. João V, cá permaneceu com a missão de realizar a História Natural de Portugal, deixando-se encantar, desde logo, pela Natureza de Sintra e, em particular, pela sua flora. Para além da sua obra científica, este autor pouco conhecido foi também um grande crítico da realidade portuguesa. A nível económico não compreendia os dispêndios de dinheiro na importação de bagas de zimbro, vindas da Holanda, quando elas existiam nas serras nacionais. A nível religioso, lamentou o excesso de poder da Igreja [3] que se revelava nefasto para a busca de conhecimento: “Neste país tudo é olhado como mistério ou feitiçaria, isto é, sortilégio ou magia. Aqui nem um homem de ciência se pode mostrar curioso e pretender instruir-se pois tem sempre receio de ser molestado pelo Santo Ofício.”[4]

Vandelli – Os Museus e os Jardins Botânicos

É também no século XVIII que se executa uma reforma na educação em Portugal, primeiro no ensino primário (1759) e, posteriormente, no universitário (1772), com a expulsão dos jesuítas, a mando de Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal (1699-1782). A História Natural era leccionada na Faculdade de Filosofia, tendo sido necessário, como complemento, criar um museu e um jardim botânico.

Domenico Vandelli (1735-1816), doutorado em Filosofia e Medicina, foi professor universitário em Pádua, até ser chamado, em 1768, pelo Marquês de Pombal para estabelecer o Jardim Botânico, junto ao Palácio da Ajuda. Este jardim serviria não só para lazer dos soberanos, mas também para experiências botânicas com vista ao melhoramento da agricultura nacional e, subsequentemente, da economia. O italiano, que já estivera em Portugal em 1764, aceitou o convite, talvez por conselho do célebre naturalista sueco Carl Lineu (1707-1778), como sugere uma carta datada de 12 de Fevereiro de 1765. Vandelli passou a leccionar História Natural e Química em Coimbra, tendo deixado o Jardim Botânico da Ajuda, do qual era director, ao cuidado do seu jardineiro Julio Mattiazzi. Num Verão em que visitou Lisboa para ver como se desenvolvia o seu jardim, constatou que este havia sido negligenciado por Mattiazzi em favor do Museu de História Natural, o que levou à perda de milhares de espécies de plantas.

Podemos encontrar outros jardins botânicos portugueses da época, tais como o Jardim botânico de suas altezas (pertencia à Casa Real) em Palhavã (Lisboa); o Jardim Botânico anexo ao palácio do Marquês de Angeja; outro em S. Sebastião da Pedreira (só se sabe que pertencia a um “provedor dos armazéns”); outro, em Benfica, do Marquês de Abrantes; e no Porto de um negociante inglês Francisco Biasly, como indica o autor, R. de Carvalho.[5]

Podemos, neste livro, encontrar, ainda, informação relativa a cientistas portugueses e ao seu contributo académico, viagens realizadas pelo mundo em busca de mais conhecimento sobre a natureza, e um capítulo dedicado à História Natural como matéria de ensino, preconizada por ilustres pensadores como Luís António Verney (1713-1792), António Nunes Ribeiro Sanches (1699-1783), ou Padre Teodoro de Almeida (1722-1804). De salientar que este último, na sua obra, debruçou-se sobre temas como a embriogénese humana e a alma nos homens e animais.


Este texto não pretende ser um resumo, mas sim breves indicações do que pode ser encontrado na leitura deste livro tão importante para a nossa cultura geral, histórica, patrimonial, ou científica.


[1] De acordo com a Acta da Sessão de 16 de Novembro de 1788 da Academia de Ciências de Lisboa, esta obra é considerada a primeira sobre a flora portuguesa. Voltou a ser reeditada, em 1789, por ordem da Academia de Ciências, a pedido de Domenico Vandelli, na época professor de História Natural na Universidade de Coimbra, que pretendia corresponder as regras de classificação estabelecidas por Lineu a essas plantas, como explica R. de Carvalho.
[2] Personagem relevante para a compreensão da História Portuguesa da época. Como sugestão de R. de Carvalho, ler: O Portugal de D. João V visto por três forasteiros (1983), tradução de Castelo Branco Chaves, e O Lúdico na Sociedade Portuguesa de Setecentos: o Testemunho de Merveilleux (1987), de Jorge Manuel Flores.
[3] José Saramago, em Memorial do Convento, retrata bem a sociedade no reinado de D. João V, e a influência da Igreja, através da Inquisição, no quotidiano.
[4] Merveilleux, Memoires instrutifs, I, pp. 101, 103, citado por R. Carvalho, A História Natural em Portugal do Século XVIII, p. 18
[5] Rómulo de Carvalho, 1987, pp. 68,69.


Bibliografia: Rómulo de Carvalho, A História Natural em Portugal no Século XVIII, Biblioteca Breve, Lisboa, 1987

BIOGRAFIA: Rómulo de Carvalho - Vida e Obra I

Foi a 24 de Novembro de 1906, na Rua do Arco do Limoeiro (hoje Rua Augusto Rosa), em Lisboa, que nasceu Rómulo Vasco da Gama de Carvalho, filho de José Avelino da Gama de Carvalho e de Rosa das Dores Oliveira Gama de Carvalho.
Rómulo de Carvalho foi um homem que se entregou às várias áreas do saber. Foi professor de Química e Física, poeta, investigador, historiador, escritor, fotógrafo, pintor e ilustrador.
Sua mãe, foi a responsável pela paixão literária, tendo-lhe dado a conhecer, ainda novo, os ilustres autores portugueses, tais como Camões, Eça, Camilo e Cesário Verde. No liceu adquiriu uma nova paixão, agora pelas ciências, devido ao seu lado experimental. Ingressa na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) para seguir o curso de Ciências Físico-químicas. Já licenciado, em 1932, formou-se em Ciências Pedagógicas, na Faculdade de Letras da mesma cidade. Enquanto professor, leccionou no Liceu Camões, Liceu D. João III e no Liceu Pedro Nunes (onde estagiara).
Colaborou como co-director na “Gazeta de Física”, e dedicou-se à divulgação científica, actividade que lhe dava imenso prazer, sendo o seu livro mais conhecido “Física para o povo”.
Nunca perdera a paixão pela literatura, escrevendo frequentemente poesia. Contudo, só aos 50 anos de idade, em 1956, após participação num concurso literário, é que publicou os seus poemas, embora sob um pseudónimo, António Gedeão. Anos depois, aventurou-se noutros géneros: teatro, ensaio e ficção.
Em 1974, após o 25 de Abril e 40 anos no ensino, reformou-se. O resto da sua vida foi dedicado à divulgação científica e à investigação em História das Ciências. Em 1983 tornou-se sócio correspondente da Academia de Ciências e, sete anos depois, assume a direcção do Museu Maynense da mesma Academia.
Aos 90 anos de idade foi homenageado a nível nacional. Faleceu a 19 de Fevereiro de 1997.


Fonte - Site oficial dedicado a Rómulo de Carvalho:
http://www.romulodecarvalho.net/biografia.html

01/02/2010

BIOGRAFIA: Brevíssima nota biográfica - Correia da Serra

O naturalista José Correia da Serra (1750-1823) nasceu em Serpa, mas, parte da adolescência e juventude foi vivida em Itália, local em que privou com personalidades de destaque a nível cultural, tais como Luís António Verney (1713-1792)[1] e D. João de Bragança, 2º duque de Lafões. Este tornou-se rapidamente grande amigo de Correia da Serra, apesar da considerável diferença de idades. O duque havia estudado em Coimbra na mesma época em que o pai do naturalista se formara em Medicina.
O naturalista é também vulgarmente conhecido por "Abade Correia da Serra", isto porque, ainda em Itália, estudou Direito Canónico e Civil e tomou ordens de presbítero, apesar de não ter dado continuidade à carreira eclesiástica, como explica R. Carvalho. [2]
Correia da Serra regressou a Portugal em 1779, e, juntamente com o seu amigo duque de Lafões, ponderaram criar uma Academia de Ciências "a fim de impulsionarem o progresso científico e técnico do nosso país" [3]. Contudo, em 1795 exilou-se em Londres, junto do amigo Joseph Banks, da Royal Society. Foi sócio de grandes instituições científicas para as quais escrevia, tais como a Royal Society, a Linnean Society, e colaborou na publicação dos Annales du Museum de Histoire Naturelle, de Paris.


[1] Para saber mais sobre este grande Iluminista, ver Rómulo de Carvalho, 1987, pp.27-29
[2] Idem, pp.101-102
[3] Idem, p.102

Bibliografia: Rómulo de Carvalho, A História Natural em Portugal no século XVIII, Biblioteca Breve, Lisboa, 1987, pp. 27-29; 101-103.

PARA SEMPRE: Correia da Serra

"O primeiro passo de uma nação para aproveitar as suas vantagens, é conhecer perfeitamente as terras que habita, o que em si encerram, o que de si produzem, o de que são capazes. A História Natural é a única ciência que tais luzes pode dar."

José Correia da Serra, in Discurso do início de Memórias Económicas da Academia das Ciências; tal como citado por Rómulo de Carvalho in A História Natural em Portugal no Século XVIII, Biblioteca Breve, Lisboa, 1987, p.74 



Nota: José Correia da Serra foi um naturalista do século XVIII e fundador da Academia de Ciências de Lisboa (Dezembro de 1779), juntamente com D. João Carlos de Bragança, 2º duque de Lafões. Juntos, criaram o Gabinete de História Natural da Academia de Ciências.